O VÍCIO DAS MÍDIAS SOCIAIS

Laís Bertoche

A ação das mídias digitais sobre o sistema de recompensa cerebral pode levar ao desenvolvimento da síndrome de dependência, semelhante à encontrada no uso das drogas ilícitas.

Mídias sociais e ética

É notória a influência de qualquer tipo de mídia sobre a ética, o comportamento, a formação de opinião, os padrões estéticos e o consumo. Lembre-se da “busca do sucesso” e do “levar vantagem em tudo” que marcaram uma geração...

A mídia digital está na ponta dos dedos e de forma rápida e eficiente se encontra tudo que se quer: pequenos textos, vídeos, documentários, receitas, fofocas, jogos... todo um universo com enorme potencial para ampliar horizontes culturais e entre-tenimento. Contudo, é preciso ter discernimento e cautela, pois muitos conteúdos refletem apenas opiniões pessoais, podendo induzir a raciocínios, discursos e posicionamentos equivocados.

Praças e telas digitais

No restaurante, nas praças e ruas, nas salas das casas e em todo lugar observamos olhares fixos nas telinhas digitais.

A internet nos conecta ao mundo. Mas ao contrário do que seria esperado, os espaços de encontro estão cada vez mais fluidos, e, em vez de dissolver as diferenças, muitas vezes aumenta a indiferença e diminui a consideração pelos sentimentos do outro: escreve-se com facilidade coisas que jamais se diria pessoalmente. E se o outro incomoda, basta bloqueá-lo e a frustração rapidamente se dissipa.

Sem responsabilidade, com dezenas, quem sabe milhares de parceiros virtuais, as pes-soas estão cada vez mais sozinhas. Pessoas, jovens e crianças cada vez mais carentes de atenção, conversa e afeto, envolvidos em encontros vazios, cheio de comparações e inveja de personagens esguios e elegantes, com a imagem de vidas magníficas e felizes calculadamente construídas...

O vício da Internet

Os responsáveis pelas crianças e adoles-centes imaginam que, fechadas em seus quartos e em si mesmas, estarão seguras e satisfeitas com seus jogos e amiguinhos online, sem perceber que essa limitação pode acentuar uma tendência à hiperativi-dade, déficit de atenção, dificuldades escolares, irritabilidade, distúrbios do sono, intolerância à frustração, afastamento so-cial, obesidade e hipertensão.

Argumentamos que basta restringir o uso e a influência da interatividade digital na vida das pessoas. Mas o que dizer das crianças e adolescentes que não possuem o discernimento necessário para se protegerem?

Atitudes que ajudam

O “New York Times” informa que quanto maior o conhecimento e entendimento da tecnologia dos celulares e dos aplicativos por parte dos pais, mais eles se preocupam e afastam seus filhos dessa tecnologia, questionando seus benefícios e afirmando que o risco de dependência é muito alto. Inúmeros estudos demonstram que todos os estímulos reconhecidos pelo organismo como prazerosos, como o atendimento das necessidades básicas (comer, dormir, fazer sexo, etc.), ouvir boa música, usar drogas ou mesmo utilizar a tecnologia digital geram mudanças nos neurotransmissores relacionados ao sistema de recompensa cerebral, aumentando a sensação de prazer.




Com o tempo, esse desejo pode transforma-se numa compulsão, produzindo uma síndrome de abstinência tão intensa e nociva quanto à dependência de drogas – com um agravante: ela é oferecida desde a tenra infância por aqueles que mais amam e querem o bem da criança.

Limites dados pela família

Cabe à família avaliar a idade e o tempo que as crianças devem ter acesso à tecnologia digital.

Há um motivo concreto que desaconselha a exposição e o uso de qualquer tipo de mídia eletrônica (inclusive TV) para crianças menores de dois anos: o desenvolvimento do sistema motor exige movimentos como pular, correr, experimentar e gastar energia. Além disso, nessa fase de curiosidade e rápido aprendizado, a criança precisa explorar seu ambiente e interagir com as pessoas. A sugestão é incentivar brincadeiras criativas, principalmente fora de casa. E como as crianças aprendem por imitação, os responsáveis não deveriam usar celular enquanto estiverem com elas, voltando-lhes completamente sua atenção.

Em torno dos sete anos, amplia-se o de-senvolvimento do sistema cognitivo da criança, sendo possível a introdução tecnológica por período de 30 minutos a uma hora por dia, sempre sob orientação e supervisão dos pais.

Por volta dos quatorze anos, a criança poderá ter acesso a um máximo de 2 horas diárias, desde que siga algumas regras básicas:
(1) não passar a noite jogando no computador;
(2) não fazer refeições assis-tindo à televisão, nem deixar de comer para ficar com tablets e smartphones;
(3) os pais devem observar seu comportamento, vida social e desenvolvimento na escola;
(4) os pais devem supervisionar e controlar programas e tempo de uso.

A sugestão é deixar o excesso de aparelhos tecnológicos para a vida adulta.

A psicoterapia como auxiliar

O que faz com que os pais se tornem reféns da vontade dos filhos e se sintam im-potentes na tarefa de estipular limites, abdicando da função de educadores? Essa resposta nem sempre é fácil, embora uma das causas possa estar relacionada a um desejo de manter a harmonia familiar no pouco tempo em que se encontram. Outro motivo pode ser o sentimento de magoa e ressentimento que se tem em relação aos próprios genitores, e o desejo de impedir que os filhos repitam esse padrão em relação a eles, pais.

Mas educar é também frustrar, definindo limites de forma clara e amorosa, para o próprio bem-estar do filho. Se não nos sentimos capazes dessa tarefa, é bem pro-vável que uma terapia como a Constelação Transgeracional possa ajudar a superar essas dificuldades, restaurando a paz, a harmonia e a saúde familiar. A Terapia Transgeracional tem por objetivo auxiliar a pessoa a desfazer-se dos padrões limitan-tes, assumindo sua sabedoria e paz interior.

Dra. Laís Bertoche: Médica Psiquiatra e Homeopata. Terapia de Família, Hipnoterapia Regressiva, Consteladora Familiar. Criadora da Terapia Transgeracional.


Texto publicado na Revista Carioca em abril/maio de 2019.

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